VALORIZAR NEM SEMPRE É SINÓNIMO COM O SEIXAL

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Ao longo dos anos, desde a inauguração do Benfica Campus em 2006, muito se tem investido no Seixal. Esse investimento não tem sido só em termos de infraestrutura, mas também nos jogadores, o projeto, e para poder ter as condições ideias para que não falte nada a quem lá trabalha.

Com o passar dos anos, o projeto tem evoluído, e com isso, o Benfica Campus tem sido alvo de vários elogios vindos de fora e dentro do país. Em 2019, esse trabalho todo foi premiado com o Best Academy Award.

Apesar dos elogios, o projeto também não se escapa a críticas.

Quando é que o clube vai ter as condições para poder depender do Benfica Campus como fornecedor primário para a equipa principal?

Tanta vez já ouvimos essa pergunta, mas qual é a realidade?

MAIS FALHAS DO QUE SUCESSOS

Vamos ser honestos – tendo em conta o número de jogadores nas camadas jovens, para cada um que tenha as capacidades para competir ao mais alto nível, certamente milhares de outros não conseguiram. Agora, quando pensamos em jogadores mais recentes como Ruben Dias e João Félix, quantos milhares é que não conseguiram chegar ao nível que sonhavam?

É sempre fácil olhar para o passado e dizer que o Benfica deveria ter lucrado mais com este ou aquele jogador. Claro, mas também podemos fazer o mesmo com jogadores que foram vendidos por uma verba considerável, e que não conseguiram dar o salto para um patamar mais alto.

Quantas vezes ao longo dos anos ficamos com água na boca a ver um jogador jovem, de quem pensamos que vai ser a próxima pérola do Seixal? Basta uns poucos jogos bem conseguidos, e a comunicação social levanta esse jogador para o próximo nível com capas de jornais absurdas.

Primeiro exemplo – Roderick Miranda. Lembro me bem de quando ele fez os seus primeiros passos na equipa principal do Benfica, apareceu uma capa de jornal a comparar o defesa Português com Carlos Mozer. Onde é que ele anda hoje? Se querem saber, está na seleção de Portugal da Inglaterra (Wolverhampton), certamente a pensar na sua próxima transferência.

Como ele, já tivemos tantos jogadores que chegaram com expectativas elevadíssimas, e depois acabarem por não agarrar a oportunidade, acabando por sair pela porta pequena.

Exemplos – Nélson Oliveira, Miguel Rosa, Miguel Vítor, André Carvalhas, João Teixeira, etc…

Desses nomes todos, provavelmente Nélson Oliveira e Miguel Rosa foram os que chegaram com as maiores expectativas, com o avançado a ser transferido para o Norwich em 2017 por €5,85M.

O argumento consistente dos adeptos que sonham com uma academia a fornecer a equipa principal são as vendas de Bernardo Silva e João Cancelo.

Esses dois foram duas apostas em que o clube ficou a perder no fim.

Por isso, podemos apontar o dedo a quem quisermos, mas naquele tempo, Bernardo foi vendido por €15,75M, e Cancelo saiu por €15M. Entre os dois, juntos, somaram cinco jogos no total pela equipa principal. Como disse mais acima, é sempre mais fácil olhar para o passado e criticar sabendo como as coisas desenrolaram. Ninguém diria que ambos iam dar nos jogadores que são hoje.

Alguém fala nas transferências de Ivan Cavaleiro (€15M), Hélder Costa (€15M), ou até João Carvalho (€15M)? E como eles, já tivemos outros.

Tendo em conta só estes exemplos, é claro que o Benfica ficou a perder com a saída de Bernardo e Cancelo, mas quem sabe se eles ficam, poderiam nem ter sido os jogadores que são hoje.

Estas são as apostas e os riscos que se apresentam no mundo do futebol. São preciso tomar decisões difíceis, e por vezes, acaba por dar certo, e por outras, nem tanto. A expectativa é que se possa acertar mais do que as vezes que se falha, e olhando para as transferências dos últimos 15 anos, acho que o Benfica tem acertado muito, quer com jogadores do Seixal, ou jogadores que chegaram jovens e foram valorizados.

Se esse dinheiro das transferências foi bem investido, isso são assuntos diferentes.

NÃO TEMPO A GASTAR

Como adeptos, temos que lembrar uma coisa – no passado, era comum as equipas apresentarem um onze inicial com maioria de Portugueses. Hoje em dia, isso é muito difícil, pelo menos para quem quer competir em todas as frentes. É triste, mas, é a realidade do nosso campeonato.

As duas principais razões disso são o dinheiro, e o tempo. De certeza que há muitas outras razões, mas vamos nos focar nestas duas.

No futebol de hoje, o dinheiro domina tudo, e infelizmente, o campeonato Português não é um dos campeonatos na Europa que possa beneficiar dos lucros financeiros. Com os contratos televisivos nos cinco campeonatos principais da Europa, é impossível um clube em Portugal poder competir com clubes da Inglaterra, ou até da Espanha em termos salariais.

Quando um jogador sai, é fácil dizer que esse mesmo jogador saiu por uma verba muito baixa. Com o mais recente exemplo sendo Ruben Dias, sim, ele saiu por menos da cláusula, mas ele é um jogador que já deu muitos anos ao Benfica, e que certamente teve mercado nos últimos dois anos, e que não saiu.

Se o Manchester City vier bater à tua porta com um contrato milionário, obviamente que vais querer a certa altura dar o salto para o bem da tua carreira. Nem sempre é só a vontade do Benfica, porque ao fim do dia, ter um jogador no plantel contra a vontade também não é ideal, e bloquear uma oportunidade única para um jovem que deu muitos anos ao clube também não é correto.

O Benfica claramente queria ter maior lucro desta transferência, mas num ano que tem sido anormal por causa da pandemia, e a inesperada eliminação da Liga dos Campeões, infelizmente certas decisões têm de ser tomadas e para os adeptos, a decisão não foi a preferida, mas sim a mais provável.

Essa oportunidade única leva me à segunda razão – tempo.

A vida de um jogador profissional é curta. Por isso, quando uma oportunidade para jogar num campeonato de top, com um salário quatro ou cinco vezes mais benéfico, a decisão é fácil. As equipas que descem de divisão na Inglaterra recebem mais dinheiro do que o campeão em Portugal, pensem bem nisso. Já não estamos no tempo em que os salários eram mais competentes, e que os Portugueses por vezes tinham um certa incerteza de jogar no estrangeiro, por isso ficavam. Esses tempos já não voltam mais.

O outro factor do tempo aplica se ao Benfica, e aos adeptos.

Todos os anos, a direção e os adeptos esperam uma equipa competente que possa lutar em todas as frentes, principalmente as competições nacionais. Podendo ter a capacidade para evoluir a academia até ao ponto de poder ser o principal fornecedor da equipa principal vai precisar de muito dinheiro, e tempo. O factor do dinheiro já expliquei mais a cima, mas agora o tempo.

Só para fazer a comparação, vamos olhar para os nossos vizinhos.

Ano após ano, eles tipicamente não investem muito, e nos últimos 15 anos, além de um ou dois momentos, o Sporting geralmente não é um sério candidato ao título.

Eles optam por investir nos jogadores da formação, e de vez enquanto pode aparecer um investimento de fora. Enquanto que podem ter identificado alguns jogadores que já saíram e deram o salto para outros patamares, os adeptos vão chegar ao ponto de dar o murro na mesa.

Certamente os adeptos não estão contentes com o quase todos os anos, e os adeptos do Benfica de certeza que nunca iriam aceitar essa filosofia por dois ou três anos, quanto mais 15.

Quando não investimos e perdemos o campeonato as críticas chegaram de todos os lados, mas esses mesmos críticos querem dar tempo à academia? Acham que é só chegar ao Seixal e escolher à mão, e pronto, temos aqui jogadores para competir? Ponham os olhos na equipa B. Eles por acaso têm lá bons jogadores e um bom treinador, mas não vamos comparar uma coisa com a outra.

A realidade é que o Benfica irá continuar a investir na academia, com a esperança de poder encontrar uma pérola de vez enquanto, mas é muito improvável que a academia seja o fornecedor principal do clube em breve, se queremos pelo menos competir nas competições nacionais.

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Michael Gonçalves

Michael Gonçalves

Desde miúdo que o Benfica faz parte da minha vida. Sou Luso-Americano, mas tenho o coração em Portugal. Enquanto que o sonho de ser jogador profissional não deu certo, agora tento transmitir as minhas ideias e a minha paixão pelo Benfica em palavras. Na vida pode se trocar de mulher, mas nunca se troca de clube!